RIO — A qualidade das pesquisas realizadas em universidades brasileiras merece reconhecimento, assim como a formação de alunos atendendo a necessidades específicas de cidades espalhadas pelo país. Medidas para internacionalizar o ensino estão em andamento. Entretanto, a burocracia atrapalha melhorias do quadro docente e de equipamentos. Essas são observações feitas por profissionais ligados ao ensino superior no dia seguinte à divulgação do ranking com as 100 melhores universidades de 22 países emergentes, no qual o Brasil aparece com apenas quatro instituições.
A relação feita pela consultoria britânica THE foi dilvulgada nesta quarta-feira. Na lista, as representantes brasileiras são a USP, em 11º lugar, a Unicamp, em 24º, a UFRJ, em 60º, e a Unesp, na 87ª colocação. A China é o país que mais aparece no ranking, com 23 instituições, seguida por Taiwan, com 21. Índia, Turquia, África do Sul e Tailândia também tem mais universidades que o Brasil. Para o editor da THE, Phil Baty, a falta de disciplinas em inglês e de pesquisas publicadas em língua estrangeira restringem a visibilidade do ensino superior no país. No entanto, ele enxerga avanços nesse aspecto:
- O programa Ciência sem Fronteiras deve ter um grande impacto a longo prazo, ao trazer talentos internacionais para o Brasil e enviar milhares de potenciais acadêmicos para instituições de elite de todo o mundo - afirma Baty.
O secretário executivo da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), Gustavo Balduino, defende que o Brasil não deve nortear a qualidade do ensino superior em função de rankings internacionais. Para ele, a eficiência das universidades deve ser avaliada de um ponto de vista mais local:
- Não adianta a gente trazer uma universidade da China e colocar no lugar da Universidade Federal do Amapá, que dialoga muito bem com os problemas e as tecnologias pertinentes àquela região - exemplifica Balduino, que culpa a qualidade dos alunos pela falta de reconhecimento das universidades brasileiras no exterior. - Isso só vai acontecer quando a educação básica apresentar melhoras significativas. O elemento substantivo do ensino superior é o cérebro. Não adianta toda a infraestrutura se não temos os melhores alunos. Havard só é Havard por conta disso. Por mais eficiente que uma universidade seja, ela não faz milagre.
De acordo com a pró-reitora de pós-graduação da UFRJ, Débora Foguel, a instituição vai começar a permitir defesas de mestrado e doutorado em inglês a partir do ano que vem. A medida será um avanço rumo à internacionalização. Mas ela acha que o desenvolvimento ainda esbarra na gestão interna, que é muito engessada. Segundo Débora, ter nos concursos públicos a única forma de ingresso de professores afasta a vinda de profissionais estrangeiros:
- Não tenho coragem de convidar alguém para ser professor da UFRJ sabendo que vai ter que passar por esse ritual - lamenta a pró-reitora, que, no entanto, pondera. - O formato em si é interessante porque não entra o “amigo do rei”. Mas esse arcabouço é ruim, se quisermos trazer alguém de fora. Tem que haver espaço pra flexibilizar, sem abrir mão do concurso.
As dificuldades na gestão das universidades também é identificada como um problema pelo diretor-geral da Faculdade AVM e ex-presidente do Conselho Nacional de Educação, Edson Nunes.
- O sistema de controle das universidades públicas é medieval. Para tomar qualquer decisão, como comprar equipamentos novos, os reitores correm o risco de ser processados, pois o sistema de controle parte do pressuposto de que todo mundo é desonesto. Toda essa burocracia atravanca o desenvolvimento e a modernização das universidades - comenta.
Por outro lado, Nunes enxerga um cenário favorável às instituições, que é a qualidade das pesquisas desenvolvidas no país.
- Estamos indo bem, sobretudo, no nível de pós-graduação, em que nossos cientistas são de classe mundial. Mas só isso não basta para aparecer nos rankings. Se quisermos este reconhecimento, temos que internacionalizar a produção, atraindo mais alunos estrangeiros e trazendo mais professores de fora - defende.
Outro motivo para o fraco desempenho pode estar na falta de investimentos. De acordo com uma pesquisa publicada no ano passado pela Organização para a Cooperação e para o Desenvolvimento (OCDE), o Brasil ocupa o 23º lugar dentre 29 países no ranking de investimentos no ensino superior. Em 2009, segundo o trabalho, o país alocou 0,8% do PIB no setor, número bem abaixo dos EUA e da Austrália, líderes nessa tabela, com 2,6%.